Do G1- O Dia de Finados é dedicado a homenagear os que já se foram. Ansiosos por localizar seus ancestrais, uma família italiana buscou a ajuda de um comerciante que, por meio de pesquisas, encontrou um cemitério perdido em Botucatu (SP). A descoberta do local pode ajudar a solucionar o mistério que incomoda a família.
Ao g1, o comerciante Fernando César dos Santos Junior, de 30 anos, contou que a descoberta inicialmente foi motivada pelo determinação dele e de outros moradores da região em localizar o cemitério que se perdeu em meio a mata e ao canavial para resgatar a memória local e valorizar a história da região do Rio Bonito em Botucatu.
Segundo Fernando, boatos apontavam que o cemitério estava submerso na água. Porém, a curiosidade para saber a verdade sobre o local "falou mais alto". A dúvida impulsionou o comerciante que, ao lado de sócios, encontraram o cemitério.
A organização para o descobrimento começou pelas redes sociais. Conforme Fernando explicou, a internet foi fundamental para reunirem documentos, marcarem reuniões, entrevistas, buscarem protocolos e autorizações oficiais.
Pelas pesquisas, Fernando, ao lado de fiscais da Prefeitura de Botucatu, um turismólogo, um historiador e uma tradutora da família italiana, descobriu que podem haver túmulos do ano de 1700 no local. Contudo, poucos têm placas que estão visíveis ou identificáveis.
“Foi possível localizar o cemitério, usando apenas a certidão de óbito que estava guardada com um parente da família italiana. Pois o cemitério não contava nos registros atuais. Apenas na memória dos mais antigos aqui. Ainda não sabemos quem foi a primeira e as últimas pessoas aqui enterradas, mas o Porto do Rio Bonito foi inundado próximo ao ano de 1954”, conta Fernando.
De acordo com os descobridores, trata-se do antigo Cemitério de Porto Martins, movimentado local de Botucatu no passado, que impulsionou a formação do Rio Bonito. Segundo narrado por Fernando, encontraram nove covas visíveis, mas fotos antigas apontam que já houve mais de 30.
Ainda segundo o comerciante, o cemitério se encontra atualmente dentro de uma propriedade privada. Para a expedição na busca, foi necessária uma solicitação formal de entrada no local, após serem barrados pelo proprietário.
No documento, enviado à prefeitura com o pedido para entrar no local, acompanhado de fiscais do executivo, o comerciante escreveu: “em busca dos corpos enterrados no Cemitério de Porto Martins, pedimos autorização para visitar o local. Gostaríamos de ver a possibilidade de retirar os corpos e levar para o cemitério público”.
Assim que obteve a autorização, Fernando foi acompanhado dos fiscais da prefeitura que emitiram um laudo que informa que “no local não existe construção de jazigos, os sepultamentos foram realizados em covas comuns. Não foi possível identificação dos restos morais”.
Após outros questionamentos à Prefeitura, Fernando lembra que foi informado de que o cemitério não consta nos documentos de registro do executivo municipal, devido à questão geográfica.
Apesar das dificuldades para identificação de quem está enterrado no local, o comerciante afirma que tem a sensação de dever cumprido ao ter localizado o cemitério. Isso porque, com a descoberta, a família italiana poderá solicitar perícia nos túmulos na tentativa de identificar se se trata do ancestral.
“Uma sensação que conseguimos ajudar alguém em vários mundos, algo queria que a gente fosse atrás deles. Acho que por isso várias pessoas se doaram a essa pesquisa. Sensação de dever cumprido, é maravilhoso ver a corrente do bem que se formou para isso acontecer”, celebra.
Os próximos passos da expedição é dar seguimento às buscas de quem são os enterrados ali, além de continuar no descobrimento de cemitérios na região, segundo ele. Há ainda o interesse em descobrir se o padre do Porto também foi sepultado ali.
“Há um relato, entre as histórias dos moradores mais antigos, que a menos de 1km desse cemitério há outro, no qual enterraram na época os corpos que apareciam no Rio Bonito. Ainda estamos estudando sua localização exata”, conta.
Família italiana
O g1 entrou em contato com a tradutora da família italiana, Mahibe Kreidi, de 57 anos, que explicou como toda a busca começou. Segundo ela, a família publicou, há dois anos, nas redes sociais sobre o fato de não conseguir localizar onde os ancestrais haviam sido enterrados (veja abaixo).
Pelas pesquisas prévias, a família italiana descobriu que os ancestrais ficaram de cinco a seis anos em Botucatu. Eles teriam vindo até o interior de SP em um navio que partiu de Gênova, na Itália, em dezembro de 1923, e chegou a Santos (SP) em 1º de janeiro de 1924.
Segundo a família italiana, a última carta enviada pelos ancestrais data de 24 de fevereiro de 1924. Se o filho do casal que pode ter sido enterrado em Botucatu estivesse vivo, ele teria 103 anos.
Pelas redes sociais, a sobrinha-neta da família recebeu informações sobre uma possível ligação dos ancestrais com o território brasileiro, mais precisamente com Botucatu. Um dos moradores, inclusive, alegou que o próprio avô teria feito o enterro do italiano no cemitério encontrado.
“O morador inclusive forneceu para a família a certidão de óbito do italiano, atestado pelo avô que fazia o serviço funerário. O Cemitério de Porto Martins é o mais antigo da região, quando, em 1954, foi inundado”, conta.
No atestado de óbito (veja abaixo) é possível perceber que o italiano morreu em 13 de abril de 1931 e foi enterrado no antigo Cemitério de Porto Martins. O próximo passo, segundo a tradutora, é pedir a perícia e exumação dos túmulos, a fim de comprovar a hipótese.
A tradutora ainda relatou que a família ficou realizada ao saber que poderiam estar mais próximos dos parentes com o descobrimento do cemitério. Segundo Mahibe, o local está quase intacto porque ficava na parte alta da cidade inundada.
“Esses ancestrais faleceram muito cedo, ela com 36 anos e o marido com 42 anos. Deixaram um filho órfão. Então a família não recebeu mais notícias deles. Foi quando a bisavó da sobrinha-neta do casal, que agora procura pelos parentes, fez um último pedido antes de morrer: que eles procurassem por esses ancestrais italianos”, destaca.
Foto: Arquivo pessoal