Uma mudança repentina nos planos de um casal que vendia artesanato em uma Praça de Jaú (SP) fez com que eles se tornassem donos da única fábrica de ossos artificiais da América Latina. O investimento inicial dos dois, de R$ 80, acabou gerando um lucro que nem mesmo os investidores acreditavam que podia acontecer. “Nunca tinha passado na cabeça ter uma fábrica de ossos, foi inusitado. Hoje faturamos mais de 1000% em relação ao investimento inicial”, conta a empresária Fabiana Maria Franceschi Costa e Silva.
Em 1995, ela e o marido tinham acabado de se formar em Administração de Sistemas de Navegação Fluvial na Fatec de Jaú e tinham como plano futuro montar uma fábrica de barcos de passeio. Para isso, Fabiana, de 41 anos, e Paulo Costa e Silva, de 42 anos, aprenderam a mexer com fibra de vidro.
Mas para investir nesse negócio, precisavam de dinheiro para montar o primeiro protótipo, então começaram a fazer e vender anjinhos de resina na praça da cidade. “Sempre gostei de artesanato, então as duas coisas casaram”, lembra Fabiana.
Cada um investiu R$ 40 e começaram a vender o artesanato, assim guardavam dinheiro para a futura fábrica. Ficaram seis meses como artesãos vendendo produtos que custavam entre R$1 a R$ 10 no valor atual, quando um empresário do ramo de próteses viu o trabalho deles e fez a proposta. “Querem tentar fazer ossos para treinamento dos médicos? E aceitamos. O empresário disse que faziam as próteses, mas não tinha onde os médicos treinarem, que treinavam em cabo de vassoura, ossos humanos, etc”, conta.
A primeira peça fabricada pelo casal foi um fêmur, que custa atualmente entre R$ 34 e R$ 69, dependendo do modelo. O empresário mostrou o que queria e o casal foi testando. “Tivemos que inventar o processo, o produto.” E mesmo próximo de comemorar seus 19 anos, a empresa ainda tem dificuldades para produzir os ossos, como é a única no Brasil, não existem fábricas que façam máquinas especializadas.
“Produção é mais da metade toda artesanal. Não tem quem faça o maquinário ou material. No começo tivemos que inventar o material, um aperfeiçoamento de uma resina, colocávamos produto de limpeza, óleo e deu certo. Atualmente uma injetora (máquina dosadora) está funcionando, mas precisa de mais”, conta Fabiana.
Evolução em pesquisas
Os ossos artificiais são usados em várias áreas na veterinária, odontologia e medicina. Como material didático para estudo de anatomia, base para desenvolvimento de novos implantes e demonstração dos implantes colocados.
De acordo com a empresária, o uso dos ossos sintéticos facilita a evolução das pesquisas e evita muitos problemas de contaminação relacionados ao uso de cadáveres. “Nossa maior satisfação é que não fazemos um produto apenas, nós colaboramos com a redução do erro médico, avançamos as pesquisas. Não se usa mais cadáveres desnecessariamente, animais não precisam ser sacrificados para estudo e não há contaminação dos que ficam expostos aos cadáveres.”
Mercado restrito e exportações
Atualmente a empresa exporta o material para cerca de 35 países e lucra uma base de R$ 3 milhões ao ano. Mas Fabiana lembra que nem sempre foi assim. “Nos primeiros dois anos cada centavo voltava para a empresa. Tínhamos a facilidade de morar com nossos pais e não precisávamos nos sustentar.”
Os produtos são comercializados a preços acessíveis que variam entre R$ 20, que o caso dos ossos dos dedos, e R$ 411, valor da estrutura da coluna. “O material é descartável por isso são peças baratas. Tem produto que depois de usado para pesquisa já é descartado.”
Na empresa, que começou com apenas o casal recém-formado, hoje em dia trabalham cerca de 40 pessoas, responsáveis pela produção dos ossos artificiais, que na maior parte da produção é feito artesanalmente.
No mundo, apenas empresas da Suíça e Estados Unidos produzem o mesmo material que empreendimento em Jaú. A empresa produz mais de 300 tipos diferentes de ossos artificiais do corpo humano e veterinário com a orientação de profissionais.
“Todo material é desenvolvido pelos médicos, dentistas e veterinários. A peça é pedida pelo profissional do jeito que ele precisa e, antes da entrega, os produtos passam pela aprovação do profissional que os encomendou", completa Fabiana. No próximo mês, a empresa completa 19 anos de criação e o casal busca expandir ainda mais o negócio exportando para mais 35 países.
Apesar desse crescimento, Fabiana e o marido decidiram continuar em Jaú, cidade do interior de São Paulo, com pouco mais de 140 mil habitantes. Mesmo longe dos grandes centros, o casal não se arrepende da escolha. “Não saímos de Jaú pela comodidade, a facilidade da família perto. Hoje com a globalização não temos problemas. A matéria-prima e mercado estão fora de Jaú.”
G1