Encontrar com amigos em ambientes online é um dos grandes motivos que explicam o sucesso de "Roblox" durante a quarentena. Mas, ao oferecer a seu público as ferramentas para construir seus próprios jogos e ganhar dinheiro no processo, a plataforma de games atrai – e forma – desenvolvedores com idades entre 12 e 16 anos.
A ideia de motivar crianças a socializar e criar faz parte da fundação do sistema e tem dado certo.
Com um lançamento para cerca de 100 pessoas em 2006, "Roblox" contava em agosto de 2020 com 164 milhões de usuários ativos por mês, de acordo com o site de análise da plataforma RT Track.
E dentro da estratégia para manter a comunidade cada vez maior está o repasse de uma porção dos ganhos para os criadores – afinal, a variedade gigantesca de jogos e itens de personalização no catálogo são atrações fundamentais do sistema.
Como lucrar
Existem duas formas básicas de ganhar dinheiro dentro de "Roblox". Grande parte dos desenvolvedores lucra com a venda de itens que fazem parte de seus jogos e com outros sistemas ligados aos games.
Já um grupo selecionado pela empresa recebe uma porcentagem do comércio de objetos cosméticos, que não afetam as habilidades dos personagens controlados pelos jogadores em todo o sistema, mas que servem para personalizá-los.
De jogador a criador
É comum que os criadores dos games sejam jovens. Geralmente, são atraídos para "Roblox" como jogadores, mas o convívio com a comunidade e com os jogos desenvolvidos por novos amigos na plataforma mostra que produções próprias não são impossíveis.
Com 15 anos, Alysson Kennedy foi convidado por um amigo para começar a jogar no final de 2015. Dois anos depois, conheceu o sistema de desenvolvimento, Roblox Studios, e decidiu se aventurar.
Sem saber programação, foi atrás de tutoriais no YouTube e pediu ajuda em fóruns na internet. O resultado foi "Treacherous tower", game lançado em outubro de 2019 e que já conta com mais de 578 milhões de visitas.
"Esse negócio de criação de jogo é algo que eu sempre me interessei. Principalmente no 'Roblox', que tem uma variedade enorme de jogos. Eu olhava e pensava que não devia ser muito difícil."
Gustavo (mais conhecido na comunidade como Guga028) seguiu caminho parecido. Depois de alguns anos como jogador, viu que o desenvolvimento era possível com a ajuda da comunidade.
Seu "Corridor of hell", criado em parceria com o jovem conhecido como Phoenix_RDN, foi lançado em maio de 2020 e já foi visitado mais de 426 milhões de vezes.
"Eu já tava interessado nessa parte do desenvolvimento, então criei um grupo no Discord para desenvolvedores brasileiros. Fui ficando mais perto das pessoas, e estou fazendo times com outros criadores para fazer mais jogos", diz o jovem de 16 anos.
Em comum, ambos falam sobre o desejo de continuar trabalhando na área a curto prazo com um futuro em aberto, têm apoio dos pais, dedicam algumas horas do dia ao desenvolvimento de seus projetos e investiram em equipamentos, como computadores novos.
Os dois também mostram que conhecem seu público, geralmente um pouco mais jovem que a dupla, e que levam isso em consideração na hora da criação.
"A gente leva bastante em conta, porque se fizer um game que é muito difícil para uma criança, ela não vai conseguir jogar e vai parar por isso", conta Gustavo.
"Mas tem que achar um equilíbrio pra também não ficar muito fácil. E a gente tem conseguido."
Selecionados
Com 25 anos, Caio Cabral faz parte do grupo de criadores de itens escolhidos pela plataforma. Com isso, tem uma ligação mais direta com a plataforma, e através do trabalho conseguiu comprar uma casa para a família.
"Foi a salvação da família na época do corona. Se não fosse o 'Roblox' eu nem sei como a gente ia conseguir passar de boa. Pararam os empregos, minha mãe não tava mais conseguindo fazer dinheiro", conta o jovem.
Ele começou a jogar no sistema em 2010, sem ambições de desenvolvimento, apesar de um interesse por artes desde pequeno.
Depois de explorar as possibilidades da modelagem em 3D com um tutorial no YouTube, ganhou em fevereiro de 2020 um concurso da empresa, que lhe garantia acesso à loja de conteúdo gerado por usuários. No catálogo, sua criações custam entre 20 e 120 Robux, a moeda do sistema (veja acima quanto vale em reais).
"Foi algo que meio que aconteceu. Eu já jogava, entendia que eram feitos, mas não entendia o conceito de modelagem. Como eu cresci em Realengo aqui no Rio, era mais do futebolzinho de rua, tinha um computador ruinzinho. Então, quando eu descobri, abriu um portão da paixão."
Já Cynthia Leys, também de 25 anos, nem conhecia "Roblox" até 2020, quando foi apresentada pelos primos de 12 e 15 anos.
"Achei que o 'Roblox' era um joguinho, mas quando você descobre que é uma plataforma imensa, você não imagina que esse tipo de coisa existe", diz a criadora.
Formada em design e com trabalhos em modelagem desde 2016, ela viu o potencial do sistema. Por isso, publicou seus trabalhos no Twitter até conseguir a atenção da empresa e ganhar acesso à loja.
Com cerca de 30% do lucro da venda dos itens, que têm preços entre 20 e 200 Robux, a designer consegue se dedicar exclusivamente ao desenvolvimento e à pós-graduação em produção artística.
No entanto, ela garante que não é tão fácil quanto parece. "Pessoas que eu conheço que ficaram nove meses tentando. Eu consegui em um mês, mas isso não é parâmetro."
Na época, a única forma de ser selecionado era através do Twitter ou dos fóruns da plataforma. Agora, a empresa lançou um site para interessados em desenvolver para a loja.
"Foi um caminho bem torto que levou a algo maravilhoso. Eu saí do trabalho em 2019 pensando em trabalhar mais com 3D, e fui me atualizando, tentando retomar, porque eu fiquei dois anos longe", diz Cynthia.
"Precisei me adaptar porque o 'Roblox' tem umas limitações. Ele não é nem tão realista, nem tão simples quanto as pessoas acham."
Pop&Art